12 jul 2023 Fonte: Saúde em Português Temas: Direitos Humanos
© Hugo Pinheiro/ Saúde em Português
Artigo por: Ana Figueiredo | Saúde em Português
30 de julho foi proclamado, através da Resolução 68/192 adotada na Assembleia Geral da ONU de 18 de dezembro de 2013, o Dia Mundial de Combate ao Tráfico de Seres Humanos. Assinalar este dia torna-se fundamental para criar contextos e promover iniciativas que alertem para a necessidade da prevenção e do combate deste crime.
Segundo o Protocolo de Palermo, artigo 3, tráfico de pessoas diz respeito ao “recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou ao uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou de situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tem autoridade sobre outra, para fins de exploração. A exploração deverá incluir, pelo menos, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, a escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a extração de órgãos”.
Este é um crime global, pois todos os países estão envolvidos, enquanto países de destino, origem ou países de trânsito. No entanto, o seu carácter transfronteiriço não é exclusivo, podendo ocorrer dentro de um país, sem necessidade de passar fronteiras. Mulheres, homens e crianças, podem ser vítimas, independentemente da nacionalidade e idade.
É um dos crimes mais hediondos da atualidade, caracterizado por ser multicausal, multidimensional, dinâmico e adaptativo. Por isso, é exigido todo um trabalho de cooperação e parcerias internacionais e nacionais com vista a um melhor conhecimento, disseminação de informação e readaptação de estratégias de combate e investigação, assim como medidas para uma maior assistência e acompanhamento destas vítimas.
Portugal, desde 2007, tem em vigor Planos Nacionais de Combate e Prevenção ao Crime de Tráfico de Seres Humanos que têm demostrado uma preocupação em melhorar a resposta nacional, na prevenção, combate, assistência e investigação. É ainda de salientar que, em prol de uma intervenção mais estruturada e articulada, surgiu em 2014, o Sistema de Referenciação Nacional de vítimas de Tráfico de Seres Humanos[1] e em 2021 o Sistema de Referenciação nacional de crianças (PRESUMÍVEIS) vítimas de Tráfico de Seres Humanos[2].
Os Relatórios Anuais[3] (MAI e OTSH) dão a conhecer esta realidade em Portugal. Dados mais recentes indicam que Portugal continua a ser um país de destino, origem e trânsito, tendo-se registado em 2022, 278 sinalizações de presumíveis vítimas, destacando-se a exploração laboral, sobretudo na agricultura.
Tendo em conta a sua missão e objetivos, a Saúde em Português, desde o início da década anterior, assumiu o compromisso de ter um papel ativo na prevenção, sensibilização, assistência e acolhimento destas vítimas, mas também na capacitação de profissionais estratégicos. Em 2010 iniciou os projetos Mercadoria Humana[4] que consistem num conjunto de iniciativas que visam sensibilizar e informar sobre este crime. Paralelamente são dinamizadas campanhas dirigidas à sociedade alertando para o crime, mas também para determinadas formas de exploração que sobrevivem ainda numa maior opacidade. Em outubro de 2022, foi apresentada a campanha “Não deixes que o teu sonho se transforme em Pesadelo[5]” que visava alertar para o facto de este crime estar presente em atividades desportivas como o futebol. Para além da sensibilização, é promovida formação direcionada a estes profissionais da área social, saúde, educação, justiça, órgãos e polícia criminal, entre outras. Acresce ainda a resposta, a nível de acolhimento e proteção, através da gestão de um dos Centros de Acolhimento e Proteção, direcionado a homens vítimas de tráfico de seres humanos, desde 2013.
No assinalar deste dia reconhecemos que passos significativos têm sido dados, contudo muito há ainda por fazer. A sensibilização e a aposta em campanhas e ações específicas, a promoção do conhecimento e a investigação, revelam-se fundamentais. Este é um crime que pode acontecer mesmo ao nosso lado, porém devemos estar alerta e reconhecer alguns sinais. Por isso, e em jeito de síntese, a mais recente exposição da Saúde em Português, da autoria de Hugo Pinheiro, intitulada “Também acontece aqui” procura revelar alguns contextos de exploração laboral na agricultura, na construção civil, no futebol, na pastorícia, a exploração sexual, a mendicidade forçada e a servidão doméstica.
Notas:
[3] Relatórios Anuais de Segurança Interna (Ministério da Administração Interna) e Relatórios Anuais do Observatório do Tráfico de Seres Humanos (www.otsh.mai.gov.pt)