06 dez 2018 Fonte: FEC Temas: Alterações climáticas e ambiente, Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, Sociedade Civil
Decorre de 2 a 14 de dezembro, em Katowice (Polónia), mais uma Cimeira do Clima das Nações Unidas, a COP24 (Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas - CQNUAC ou, em inglês UNFCCC). A Plataforma Portuguesa das ONGD foi convidada pela Agência Portuguesa do Ambiente, responsável pela delegação portuguesa, a acompanhar os trabalhos.
A ação climática está hoje em dia necessariamente associada ao Acordo de Paris, meta histórica conseguida em 2015, no contexto da COP21 em Paris. Depois de um já longo percurso de análises e esforços conjuntos (as convenções tiveram início em 1995, no seguimento da Cimeira da Terra em 1992), foi possível um compromisso ambicioso de 196 países no sentido de garantir a redução de gases com efeito de estufa e assim controlar o aumento da temperatura (abaixo dos 2ºC relativamente à era pré-industrial) e impactos que daí advém. As evidências científicas incontornáveis e a vontade política assente no espírito de compromisso e solidariedade entre países permitiu alcançar o primeiro acordo universal e juridicamente vinculativo na matéria.
O que se espera desta COP? Muito. O Acordo de Paris pôs em marcha vários processos, que em Katowice devem ser reajustados e fechados, sob pena de perdermos a oportunidade de reverter uma situação cada vez mais irreversível para o Planeta e para a Humanidade.
Uma primeira expetativa é fechar o Programa de Trabalhos que levará à prática o próprio Acordo, o que até agora se intitulava de "Livro de Regras". No fundo, o passo decisivo que irá garantir que em 2020 (ano de entrada em vigor do acordo), as boas intenções passarão à prática. Por outro lado, no contexto da COP 21, e como forma de justificar a necessidade de fixar a meta máxima de aquecimento global nos 1,5ºC e não nos 2ºC (questão que acabou por ficar em aberto), foi encomendado ao IPCC (Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas), um relatório especial que analisasse a diferença deste escasso meio grau centígrado, o qual foi agora apresentado. E a diferença é muita e está quantificada - de um degelo bem mais agravado, de muitas vidas perdidas com desastres naturais cada vez mais frequentes e agressivos, em especial para as comunidades mais pobres e vulneráveis, de muitas espécies a extinguir-se drasticamente com perdas de biodiversidade e ecossistemas que nos sustentam "invisivelmente" a todos; de um ainda mais agravado extremismo climático com elevadas temperaturas e irregularidade de precipitação, fenómenos que estão já a atingir vastas áreas e populações do planeta. Assim, o grande desafio de Katowice é também aumentar a ambição dos chamados NDC (Contribuições Nacionais Determinadas), a contribuição dos Estados Nacionais para a ação climática global, integrando estratégias prioritárias nas diferentes áreas relevantes para uma transição nos modelos atuais de produção e consumo - energia, indústria, transportes, urbanismo, agricultura e sistemas alimentares, uso do solo no geral, entre outros. Por último, algo muitíssimo importante para que todo este processo possa acontecer: garantir o financiamento suficiente, regular e previsível, de forma transparente e justa, conforme acordado em Paris, nomeadamente no que toca ao apoio aos países menos desenvolvidos, quer em termos de adaptação (com apoio técnico e transferência de tecnologias) quer em termos de mitigação dos impactos causados.
Um dos processos a decorrer com o objetivo de mobilizar esforços extra e garantir as metas necessárias, aas quais necessitam da contribuição de todos - estados, setor privado, sociedade civil, cientistas - é o chamado "Diálogo de Talanoa". Talanoa é uma tradição das ilhas do pacífico, profundamente enraizada nas Fiji, e que representa um diálogo inclusivo, participativo, assente na partilha de narrativas e criação de pontes. Este processo tem por base três questões: Onde estamos? Para onde queremos ir? Como lá chegar? Perguntas simples que têm sido a base de articulação aos mais diversos níveis, que em Katowice ganharam um novo impulso numa segunda fase, agora política, do processo.
Essas mesmas perguntas foram postas na sessão plenária de apresentação do relatório especial do IPCC por diferentes delegações das pequenas ilhas do Pacífico, condenadas a desaparecer com a subida do nível médio das águas do mar, se continuar a haver inércia irresponsável numa resposta global.
Ainda é cedo para tirar conclusões, até porque o processo está ainda no início. Mas podemos já concluir alguns passos e contributos importantes a acontecer do lado da sociedade civil: colaborar com as delegações nacionais no reajustamento e cumprimento das estratégias nacionais, nomeadamente apelando à articulação das diferentes agendas, em especial as do ambiente e desenvolvimento; apelar à transversalidade da questão climática em todos os setores, garantindo uma ação coordenada e o financiamento adequado; contribuir para estratégias de cooperação que implementem de forma coerente estratégias de adaptação e mitigação nos países em desenvolvimento; continuar a contribuir de forma articulada e integrada para a prossecução das estratégias nacionais de educação para o desenvolvimento, educação ambiental e educação cívica, protagonizando e mobilizando estilos de vida e políticas mais justas e sustentáveis; demonstrar e partilhar alternativas locais que influenciem políticas catalisadoras de mudanças sistémicas. Por último, um desafio muito concreto, de acompanhar e contribuir para a participação nacional na Cimeira especial para o Clima, lançada em Katowice por António Guterres, Secretário Geral das Nações Unidas, a realizar-se em setembro de 2019, à margem da Assembleia Geral nas Nações Unidas em Nova Iorque. Este será o ponto de chegada de um ano onde estão previstos diferentes processos de sensibilização e ação que contam com especial mobilização dos jovens.
Como dizia António Guterres na sessão de abertura da COP 24:
"Alguns podem dizer que será uma negociação difícil. Eu sei que não é fácil. Requer uma firme vontade política de compromisso. Mas, para mim, o que é realmente difícil é ser um pescador em Kiribati vendo seu país em risco de desaparecer ou um fazendeiro ou pastor no Sahel perdendo a subsistência e perdendo a paz. Ou ser uma mulher em Dominica ou qualquer outra nação do Caribe que sofra furacões após o furacão destruindo tudo em seu caminho."
Continuaremos a seguir a COP 24 ao longo destes dias, mas sobretudo, continuaremos empenhados na implementação a nível nacional de uma ação climática global.
Para mais informações:
Margarida Alvim, Fundação Fé e Cooperação, em representação da Plataforma Portuguesa das ONGD na COP 24