21 ago 2020 Fonte: CONCORD Europe Temas: União Europeia, Cooperação para o Desenvolvimento, Pobreza e Desigualdades
A CONCORD – Confederação Europeia de organizações não-governamentais de Ajuda Humanitária e Desenvolvimento - publicou recentemente um documento em que apresenta um conjunto de propostas para a transversalização da igualdade na cooperação internacional. Ao reconhecer a urgência da redução das desigualdades a nível global, a organização aponta caminhos para efetivar a integração sistemática do tema em todos os domínios da cooperação para o desenvolvimento da UE, enquanto defende que este trabalho deve ser complementado por ações direcionadas para enfrentar especificamente as desigualdades.
Nas últimas décadas a redução da pobreza extrema tem contrastado com um aumento das desigualdades entre e dentro dos países. A nível global, e apesar do abrandamento económico mundial, das guerras comerciais e das tensões geopolíticas, verifica-se uma crescente concentração da riqueza no 1% mais rico da população mundial, e um aumento do nível de riqueza e número de milionários (em 2019, o aumento foi de 9%). Estes são sintomas claros da “pandemia da desigualdade” e da necessidade de a combater, como defendeu o Secretário Geral das Nações Unidas, António Guterres, numa comunicação realizada por ocasião da comemoração do Dia Internacional Nelson Mandela, a 17 de julho de 2020
Com a inclusão do ODS 10 - Reduzir as Desigualdades no Interior dos Países e Entre Países - a aprovação da Agenda 2030 em 2015 veio reconhecer a necessidade de promover a igualdade entre todos e todas, reafirmada no princípio estruturante da Agenda 2030 de “não deixar ninguém para trás”.
Considerando a importância do tema para o setor do Desenvolvimento Internacional, a CONCORD preparou um policy brief (CONCORD proposals for mainstreaming equality in international cooperation), que foi publicado no final de junho deste ano, no qual advoga que o cumprimento do compromisso por parte das instituições europeias, assumido no quadro do Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento (2017), de integrar a redução da desigualdade na cooperação para o desenvolvimento, implica um reconhecimento da natureza multidimensional e interseccional do problema, assim como a orientação, disponibilização de ferramentas e formação dos recursos humanos das instituições da União Europeia.
Para potenciar a efetivação da transversalização da igualdade na cooperação internacional da UE, a CONCORD apresenta seis propostas concretas que abrangem não só a necessidade de realização de análises e avaliações de impacto por país parceiro mais focadas no caráter multidimensional e interseccional das desigualdades, assim como de uma maior aposta na recolha e desagregação de dados para a compreensão do fenómeno e no fortalecimento da capacitação dos recursos humanos da UE e criação de diretrizes específicas para o trabalho na área.
Um dos aspetos centrais destacados relaciona-se com a necessidade da realização de uma análise multidimensional e interseccional das desigualdades por país de modo a que, por um lado, possam ser consideradas as várias dimensões de desigualdade relevantes para a vida das pessoas e, por outro lado, seja tida em conta a combinação persistente de desigualdades ligadas às características e identidade de uma pessoa ou grupo, que contribuem para o agravamento das desigualdades e diminuição das suas capacidades potenciais em relação ao resto da população. Para a realização desta análise, a CONCORD advoga pela criação de Perfis de Igualdade por País, os quais considera poderiam guiar a preparação dos programas indicativos plurianuais da UE para cada país e o diálogo político com os Estados-Membros e outros atores no país ou região, permitindo perceber se o combate às desigualdades é uma prioridade nas estratégias, políticas e orçamentos nacionais e setoriais dos países parceiros.
A realização de uma avaliação do impacto das desigualdades nas políticas, programas e projetos é outra das propostas apresentadas, para garantir a coerência das políticas e criar sinergias entre as diferentes políticas, programas e projetos da UE. A realização de uma avaliação na fase preparatória de programas ou projetos para perceber o seu potencial impacto nos grupos mais marginalizados e nos países menos desenvolvidos é por isso considerada fundamental. A CONCORD manifesta ainda o seu apoio à criação de um marcador de igualdade que permita medir e monitorizar a contribuição do financiamento da cooperação para o desenvolvimento da UE para a redução das desigualdades nos países parceiros.
O destaque concedido à importância do diálogo sobre as políticas e à aposta na assistência técnica junto dos governos parceiros, bem como à necessidade de obtenção de dados desagregados e de integração da igualdade na monitorização e avaliação, justificam-se pela necessidade de um maior reconhecimento da importância de uma ação nacional concertada nesta área, envolvendo a participação e as perspetivas de grupos marginalizados, assim como de dispor de informação fidedigna para compreender como diferentes tipos de desigualdades interagem. Desta forma, uma aposta no fortalecimento das estruturas de recolha de dados nos países e a criação de indicadores são aspetos fundamentais para entender o impacto das políticas em grupos específicos.
As propostas apresentadas constituem um avanço no sentido da materialização de mecanismos e ações para responder à premência do cumprimento do princípio de “não deixar ninguém para trás” e poderão constituir um passo importante para uma ação mais consequente da ação externa da UE para a redução das desigualdades nos países parceiros da sua cooperação para o desenvolvimento.