07 nov 2019 Fonte: Vários Temas: Ajuda Pública ao Desenvolvimento, Migrações e Refugiados
No passado dia 24 de outubro foi rejeitada por dois votos a proposta apresentada pela Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos do Parlamento Europeu (LIBE), que tinha por objetivo reforçar a busca e o salvamento de refugiados/as no Mar Mediterrâneo. Houve mais três propostas, - na sequência da primeira - também elas rejeitadas.
Na proposta original, que desencadeou a apresentação de outras propostas alternativas, a comissão LIBE “Insta os Estados-Membros da UE a reforçarem as operações de busca e salvamento proativas, disponibilizando navios e equipamento suficientes especificamente dedicados às operações de busca e salvamento pessoal, ao longo das rotas em que possam contribuir eficazmente para a preservação de vidas, quer sob a égide de uma operação coordenada pela Frontex, quer ao abrigo de operações internacionais ou de operações nacionais ou regionais independentes, de preferência de caráter civil; insta a Comissão a apoiar política e financeiramente estas iniciativas; insta os Estados-Membros a utilizarem plenamente todos os navios capazes de prestar assistência em operações de busca e salvamento, incluindo navios operados por ONG; considera que os navios das ONG e a marinha mercante não devem substituir o cumprimento devido pelos Estados-Membros e pela União das suas obrigações em matéria de busca e salvamento no âmbito de uma abordagem a mais longo prazo, estrutural e coordenada”.
Esta proposta desencadeou outras três: uma do Grupo Identidade e Democracia (ID), outra do grupo dos Conservadores e Reformistas Europeus (CRE), e outra do Partido Popular Europeu (PPE).
A proposta do Grupo de extrema direita Identidade e Democracia opunha-se "à criação de mais vias legais para a migração" reiterava que “a Europa não deve ser vista como um recetáculo para oportunistas económicos provenientes de África ou prospetores de outras regiões em todo o mundo”, defendendo que “os Estados-Membros devem ser autorizados, se necessário, a reintroduzir fronteiras internas".
O Conservadores e Reformistas Europeus, sublinhando " a obrigação (...) de prestar assistência a pessoas em perigo”, defendiam na sua proposta que “os Estados-Membros têm todo o direito de aplicar a legislação nacional quando tomam a decisão de autorizar ou não a entrada de navios de ONG nos seus portos” e que o os Estados-Membros devem “tornar o registo dos navios de ONG o mais transparente possível, a fim de garantir que existam informações claras sobre a origem do seu financiamento". Mais, o grupo instava a comissão a “propor políticas racionais e exequíveis de forma a garantir que apenas os migrantes que necessitam efetivamente de proteção internacional cheguem à União Europeia por rotas seguras”.
Por último, a proposta do PPE, além de recordar as obrigações decorrentes do direito internacional do mar de prestar assistência a pessoas em perigo, instava também “os Estados-Membros e a Frontex a intensificarem os seus esforços de apoio às operações de busca e salvamento no Mediterrâneo”. No documento, o PPE não deixa de reafirmar que “a política de migração da UE deve basear-se numa distinção clara entre migrantes económicos e refugiados, que as vias legais e os corredores humanitários apenas podem ser criados exclusivamente para os refugiados e que a migração económica irregular para a UE deve ser reduzida de forma significativa”.
Todas as propostas foram rejeitadas. As resoluções dos grupos parlamentares não pretendiam chegar a uma versão consolidada que incluísse propostas de outros grupos, e por isso nunca teriam hipótese de serem aprovadas. Por outro lado, a proposta da LIBE era já consolidada, visto que foi negociada e votada por diferentes grupos em sede de comissão parlamentar, incluindo diversas emendas e propostas de correção ao texto inicial – foi também a proposta que mais se aproximou da aprovação. A votação resultou em 290 votos contra e 288 a favor, sendo assim mais uma vez chumbada uma resolução do Parlamento Europeu que, não tendo carácter legislativo, pretendia pressionar a Comissão Europeia e os Estados-Membros a reverem o sistema comum de asilo e encontrarem (finalmente) um mecanismo justo e solidário de repartição dos refugiados entre os vários países que integram a União Europeia.
Desde 2016 que sucessivas votações com este objetivo resultaram sempre no chumbo de diferentes propostas. Os diferentes grupos parlamentares do Parlamento Europeu não conseguiram, até ao momento, construir uma proposta que reúna um consenso suficientemente alargado para que seja aprovada, havendo mesmo diferentes opiniões e sentidos de voto diferentes dentro do mesmo Grupo Parlamentar. A discussão sobre a proposta rejeitada a 24 de Outubro voltará à comissão LIBE para novas discussões.
Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), desde 2015, ano que marcou o pico das chegadas à Europa, até ao final de Setembro deste ano, morreram pelo menos 15 mil pessoas a tentar atravessar o Mediterrâneo – o que faz desta rota de migração a mais mortífera de todo o mundo – e, consequentemente, do auxílio às pessoas que arriscam a vida em busca de um futuro melhor, uma obrigação moral.
A recusa de ajuda humanitária às pessoas mais vulneráveis constitui uma violação dos direitos humanos, e as violações de direitos humanos não são compatíveis com uma Europa que se diz e se quer fundada em valores como a dignidade humana, a igualdade e a liberdade.