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30 abr 2025 Fonte: Plataforma Portuguesa das ONGD Temas: Financiamento para o Desenvolvimento, Cooperação para o Desenvolvimento, Cidadania e Participação, Ajuda Pública ao Desenvolvimento, Advocacia Social e Política

Num mundo cada vez mais marcado pela fragmentação geopolítica, pela aceleração das desigualdades e pelas falhas sistémicas das respostas globais a crises múltiplas — das alterações climáticas à instabilidade financeira -, a noção de Desenvolvimento Internacional está a ser desafiada de forma radical. É neste contexto que surge a 5.ª edição do International Development Summer Course (IDSC), com o mote: “Cooperação num mundo em disrupção: quem define as regras?”

Organizado pela Fundação Calouste Gulbenkian, pela Plataforma Portuguesa das ONGD e pelo ISEG – CEsA/Oficina Global, o IDSC decorre entre os dias 26 e 30 de maio de 2025, em formato online e com acesso gratuito. Trata-se de uma oportunidade única para analisar criticamente o presente e o futuro da Cooperação Internacional, num espaço que combina o pensamento académico, a experiência prática e a opinião pública, pela lente de pensadores/as internacionais.

O evento convida-nos a revisitar algumas das narrativas mais enraizadas no campo do Desenvolvimento: a ideia de que a Ajuda Internacional é inerentemente benéfica, que o crescimento económico é um sinónimo de progresso, ou que a democracia liberal, tal como entendida no Ocidente, é condição suficiente para o florescimento das sociedades. Estas premissas, historicamente promovidas pelas grandes instituições financeiras multilaterais e por governos do Norte Global, são hoje alvo de crescente contestação.

A 5ª Edição do International Development Summer Course propõe um olhar crítico sobre estes modelos e uma desconstrução do discurso dominante. O objetivo não é apenas reformular a Ajuda ao Desenvolvimento — é questionar a própria arquitetura da Cooperação Internacional. Quem decide as prioridades? Em benefício de quem? E com que implicações para a soberania, a justiça e a sustentabilidade?

Desde a sua criação em 2017, o IDSC tem-se afirmado como um espaço de reflexão conceptual e de debate interdisciplinar. A primeira edição centrou-se na Teoria da Mudança como ferramenta de planeamento, evoluindo depois para temas como a Inovação para o Desenvolvimento (2019), o Impacto da Pandemia (2021) e os limites do Desenvolvimento Global face à crise climática e à erosão democrática (2023). Este histórico revela um compromisso claro com a atualidade crítica e com a complexidade do Desenvolvimento, através da criação de um espaço para desaprender e reimaginar: desaprender os modelos hegemónicos e reimaginar um Desenvolvimento que não se paute por relações desiguais de poder, interesses estratégicos ou métricas de mercado.

De "Ajuda" a "alavanca": a cooperação como instrumento de poder

Um dos temas centrais da edição de 2025 é a instrumentalização da Ajuda. Nas últimas décadas, o discurso oficial em torno da Ajuda ao Desenvolvimento tem sido dominado por uma linguagem de solidariedade, altruísmo e parcerias para o progresso. No entanto, uma análise mais atenta revela um fenómeno preocupante: a transformação da cooperação internacional num instrumento de poder geopolítico e económico, cada vez mais sofisticado. A Ajuda deixou, em muitos casos, de ser um mecanismo de redistribuição justa para se tornar uma ferramenta de condicionalidade política, influência estratégica e, frequentemente, de domínio económico.

Este fenómeno será discutido logo na sessão de abertura, “Aid, Trade or Charade: What Drives International Cooperation?”. Se a ajuda internacional é cada vez mais moldada pelos interesses estratégicos dos países doadores — seja para garantir acesso a recursos naturais, conter fluxos migratórios ou afirmar hegemonias regionais —, então estamos perante uma profunda distorção do espírito fundacional da Cooperação para o Desenvolvimento.

A segunda sessão, “International Cooperation as Leverage: When Aid Turns into Debt”, lança luz sobre esta realidade, examinando como é que os empréstimos, subvenções condicionadas e pacotes de apoio técnico são usados como formas de alavanca económica e política. A dívida externa de muitos países do Sul Global não é um “subproduto acidental”, mas um resultado esperado de sistemas de financiamento que criam dependência e limitam a margem de manobra das economias periféricas.

Mas este não é apenas um problema de intenções políticas. O próprio modelo económico que sustenta a Ajuda é posto em causa na terceira sessão, “Economic Growth = Development?”, onde se discute a persistente associação entre crescimento do PIB e bem-estar social. Muitos países recetores de Ajuda veem as suas economias crescerem sem que isso se traduza em justiça social, equidade de género, acesso a serviços públicos ou respeito ambiental. O crescimento torna-se, assim, uma métrica vazia, frequentemente usada para justificar intervenções que pouco ou nada contribuem para a transformação estrutural.

Neste contexto, ganha especial relevância o debate sobre “Democracy in a Vacuum: Can It Deliver Development?”, pois questiona o papel da democracia liberal, tal como promovida internacionalmente, para um desenvolvimento enraizado nos territórios, nas culturas e nas vozes locais. Que tipo de democracia estamos realmente a exportar? E pode essa democracia sobreviver num contexto em que as decisões políticas fundamentais são determinadas por condicionalidades externas e por atores com poder económico-financeiro?

Finalmente, conclui-se com a sessão “Post-Aid or Post-Development? Rethinking Global Finance”. Aqui, a reflexão desloca-se da crítica à criação: como financiar o Desenvolvimento de forma justa e equitativa? Que papel podem desempenhar os Bancos de Desenvolvimento do Sul, ou os mecanismos de financiamento climático? A sessão desafia os participantes a imaginar modelos pós-ajuda que rompam com as lógicas extrativistas e as assimetrias que historicamente marcaram a Cooperação Internacional.

A trajetória da Ajuda Internacional, do pós-guerra até aos dias de hoje, revela-se assim um campo de disputa e contradições, onde se cruzam interesses económicos, discursos de legitimidade moral e lutas por autonomia. O IDSC 2025 propõe não apenas uma leitura crítica destes processos, mas também a construção de novas gramáticas de cooperação — mais horizontais, mais plurais, e verdadeiramente comprometidas com a justiça global. A questão não é se haverá mudança. A questão é: quem a irá controlar e como irá ela evoluir?

Participar para transformar

Mais do que uma formação, o IDSC é uma provocação: um convite à ação crítica, à renovação conceptual e à construção de alianças mais horizontais e transformadoras na arena internacional. Neste espírito, o IDSC 2025 convida profissionais de organizações da sociedade civil, investigadores, estudantes, jornalistas e decisores políticos a participarem num diálogo aberto sobre as alternativas possíveis. O curso decorrerá online, com tradução simultânea português-inglês, e exige inscrição prévia.

Saiba mais e inscreva-se aqui: https://www.plataformaongd.pt/agenda/international-development-summer-course-cooperacao-num-mundo-em-disrupcao-quem-define-as-regras

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