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16 nov 2022 Fonte: Revista da Plataforma Portuguesa das ONGD Temas: Educação para o Desenvolvimento e a Cidadania Global

Este artigo foi originalmente publicado na Edição da Revista da Plataforma Portuguesa das ONGD de novembro de 2022 "Educação para o Desenvolvimento e a Cidadania Global em Tempos de Mudança" Leia ou faça download da edição completa da Revista aqui.
 

Por: 
La Salete Coelho - Centro de Estudos Africanos da Universidade do Porto e Instituto Politécnico de Viana do Castelo. 
Mónica Lourenço - Universidade de Aveiro.


A Educação para o Desenvolvimento1 (ED) é um processo de aprendizagem ao longo da vida comprometido com a educação integral das pessoas, com o desenvolvimento do questionamento crítico e eticamente informado e com a participação cidadã. Surgida da convergência entre perspetivas teóricas e agendas de intervenção, a ED tem como fim último a transformação social no combate às desigualdades estruturais de poder e riqueza que existem (e subsistem) à escala planetária, bem como aos mecanismos que as perpetuam.  A ED é, portanto, um conceito multidimensional com implicações pedagógicas, políticas, práticas, culturais e éticas. A nível pedagógico, a ED configura um processo de aprendizagem que sensibiliza e promove o questionamento crítico; a nível político, a ED consciencializa e mobiliza para a transformação social tanto no plano coletivo, como no plano individual; a nível cultural, a ED compromete-se com o reconhecimento, valorização e preservação da identidade e da diversidade culturais; por fim, a nível ético, a ED baseia-se em princípios e valores de justiça, equidade, solidariedade, inclusão, interculturalidade e sustentabilidade, assumindo-se como uma perspetiva educativa marcadamente ideológica.

ED tem como fim último a transformação social no combate às desigualdades estruturais de poder e riqueza que existem (e subsistem) à escala planetária, bem como aos mecanismos que as perpetuam

Em Portugal, a ED é uma área de crescente interesse. Tendo surgido sobretudo pela mão de Organizações Não-Governamentais, foi assumida, em 2005, no documento intitulado "Uma Visão Estratégica para a Cooperação Portuguesa", como uma área prioritária. Em 2008 foi lançado o processo de elaboração de uma estratégia nacional, participativo e inclusivo, de forma a assegurar que a estratégia viveria para além da publicação, e seria implementada por todos os intervenientes da ED a fim de assegurar o seu impacto a longo prazo. Este processo foi inspirado em processos similares que estavam a decorrer pela Europa, promovidos pelo GENE – Global Education Network Europe, rede interministerial europeia na área da Educação Global. Em setembro de 2009, a Estratégia Nacional Portuguesa de Educação para o Desenvolvimento2 (Despacho n.º 25931/2009), foi apresentada numa cerimónia pública, tendo sido assinado, em 2010, um Protocolo de Implementação do Plano de Ação ENED. Em 2017, o Relatório de Avaliação Final da ENED 2010-2016reconheceu a importância deste enquadramento estratégico para a promoção da ED em Portugal. 

Em setembro de 2009, a Estratégia Nacional Portuguesa de Educação para o Desenvolvimento (...), foi apresentada numa cerimónia pública. Em 2017, o Relatório de Avaliação Final da ENED 2010-20163 reconheceu a importância deste enquadramento estratégico para a promoção da ED em Portugal.
 

Também no sistema educativo português foram dados passos para a integração da ED no currículo. Este papel tem sido atribuído, essencialmente, à área de Cidadania, tendo esta assumido diferentes denominações e modelos nos últimos anos. Em 2012 surge uma primeira referência à Educação para o Desenvolvimento num documento orientador emanado da Direção-Geral de Educação, Educação para a Cidadania - Linhas Orientadoras4 e mais tarde, em 2016, o Referencial de Educação para o Desenvolvimento - educação pré-escolar, ensino básico e ensino secundário5

O ano de 2018 apresenta-se como fundamental para a ED em Portugal:
- por um lado, nesse ano, o sistema educativo português é alvo de uma reforma educativa (Decreto-lei n.º 55/2018, de 6 de julho). A Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania(2017) consagra a componente de currículo Cidadania e Desenvol¬vimento, prevista como parte integrante de todos os anos de escolaridade, na qual são propostos dezassete domínios, sendo a Educação para o Desenvolvimento Sustentável uma das áreas a abordar.
- por outro, é lançada a atual Estratégia Nacional de Educação para o Desenvolvimento 2018-2022 (Resolução do Conselho de Ministros, n.º 94/2018), resultado de diversas oficinas dedicadas à questão concetual, à sua estrutura e aos compromissos a assumir.

Este novo documento, prestes a chegar ao seu término, assentou na implementação de um Plano de Ação construído em torno a quatro objetivos estratégicos (Figura 1): 

 
Figura 1 – Objetivos estratégicos do Plano de Ação da ENED.

Durante o ano de 2020 realizou-se a Avaliação Intermédia da ENED 2018-20227.  Para responder às recomendações daí resultantes, particularmente a aposta na clareza concetual e na capacitação dos diferentes atores envolvidos na ENED, foi promovida, em 2021, pela Plataforma Portuguesa das ONGD uma oficina formativa direcionada às ESPA como forma de reforçar a apropriação da ENED. Com vista a contribuir para a operacionalização das recomendações que respeitam a diversificação de promotores, ao robustecimento do trabalho colaborativo e das ações de capacitação e a uma maior abrangência territorial, foi instituído, pelo CICL, um Mecanismo de Apoio a Iniciativas correspondentes a pequenas intervenções-chave de cariz multiplicador a serem desenvolvidas pelas ESPA, em possível parceria com outras entidades. 

a ENED vive um momento de particulares desafios, quer a nível nacional, quer a nível internacional

Neste momento, a ENED vive um momento de particulares desafios, quer a nível nacional, quer a nível internacional.   Encontrando-nos no último ano de implementação, existe uma ação significativa a implementar – o Fórum de ED, que se pretende como uma ação de natureza política, de discussão e definição de estratégias, incluindo também uma forte componente de disseminação do trabalho realizado. Para além desta ação em concreto, avizinham-se dois processos – o da avaliação final e o de elaboração do novo quadro estratégico – fundamentais para a definição do futuro da ED em Portugal. Ao nível internacional, será desafiante para Portugal a liderança da Iniciativa Ibero-Americana de Cidadania Global para o Desenvolvimento Sustentável8, iniciada este ano com mais seis países da região, no âmbito da SEGIB – Secretaria-Geral dos Estados Ibero-Americanos, com o objetivo de promover, a partir dos organismos coordenadores da cooperação internacional, a criação e fortalecimento de agendas nacionais na área da Cidadania Global para o Desenvolvimento Sustentável em articulação com outros atores relevantes. Interessará ainda saber como o novo enquadramento legal integrará os compromissos assumidos na nova Declaração Europeia de Educação Global, lançada pelo GENE, no dia 4 de novembro9, ligados à coerência política; ao apoio aos atores; à educação formal e não formal; à avaliação, qualidade e investigação; ao financiamento; e à coerência das políticas a nível internacional.

Quinze anos volvidos desde o primeiro passo para a elaboração de um quadro estratégico para a ED em Portugal, 2023 será, sem dúvida, um ano cheio de desafios! 

 

Notas:

1  Apesar de utilizarmos neste texto o termo de Educação para o Desenvolvimento, expressão eleita no quadro estratégico nacional, importa salientar a variedade concetual em torno destas temáticas. Nas mais recentes discussões salientam-se: Educação Global, expressão cunhada em 1989 pelo Centro Norte-Sul do Conselho da Europa, e disseminado, sobretudo pelo GENE – Global Education Network Europe; Aprendizagem Global, expressão utilizada sobretudo nos países do Norte da Europa desde a década de 90; Educação para a Cidadania Global, expressão surgida no âmbito da UNESCO e destacada na meta 4.7 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável; ou Educação para a Cidadania Planetária, expressão mais utilizada na América Latina, numa linha freiriana.. Esta multiplicidade de conceitos pode ser justificada pela novidade desta área e pela sua natureza de ser uma resposta a desafios, sempre novos, colocados pelo mundo atual. 
2  https://ened-portugal.pt/pt/introducao-1
3  https://ened-portugal.pt/pt/avaliacao-externa
4 http://dge.mec.pt/educacao-para-cidadania-linhas-orientadoras-0
5 http://www.dge.mec.pt/sites/default/files/ECidadania/educacao_desenvolvimento/Documentos/referencial_de_educacao_para_o_desenvolvimento.pdf
6  http://dge.mec.pt/sites/default/files/Projetos_Curriculares/Aprendizagens_Essenciais/estrategia_cidadania_original.pdf
7  https://ened-portugal.pt/pt/avaliacao-intermedia
8  https://www.segib.org/pt-br/programa/iniciativa-iberoamericana-de-ciudadania-global-para-el-desarrollo-sostenible-cgpds/

 

Este artigo foi originalmente publicado na Edição da Revista da Plataforma Portuguesa das ONGD de novembro de 2022 "Educação para o Desenvolvimento e a Cidadania Global em Tempos de Mudança". Leia ou faça download da edição completa da Revista aqui.

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