16 nov 2022 Fonte: Revista da Plataforma Portuguesa das ONGD Temas: Migrações e Refugiados, Educação e Formação

Este artigo foi originalmente publicado na Edição da Revista da Plataforma Portuguesa das ONGD de novembro de 2022 "Educação para o Desenvolvimento e a Cidadania Global em Tempos de Mudança" Leia ou faça download da edição completa da Revista aqui.
Por Monica Frechaut, Conselho Português para os Refugiados (CPR)
No último ExCom1, dizia-nos o Alto-Comissário das Nações Unidas para os Refugiados, Filippo Grandi, que “a procura por respostas do ACNUR nunca foi tão grande, enquanto que o seu espaço para encontrar soluções nunca foi tão pequeno.” De facto, não são estranhas para a maioria de nós as principais causas das migrações forçadas. Às mais comuns como as guerras, conflitos, a violência generalizada, o terrorismo, a perseguição étnico-religiosa, mas também as causas profundas de desigualdade, pobreza, discriminação, Estados de direito fracos e falta de boa governança, acrescentamos agora a emergência climática, que impulsiona cada vez mais o deslocamento, tornando a vida para aqueles que muitas vezes já estão deslocados, ainda mais difícil.
Testemunhamos, repetidamente, como conflitos violentos e outros fatores de deslocamento forçado têm consequências que assumem dimensões não só regionais, mas também globais, como é o caso da invasão russa da Ucrânia, a maior e mais rápida crise de deslocação na Europa desde a Segunda Guerra Mundial, com consequências na vida de todos nós, mas sobretudo nos mais vulneráveis. Nestes cenários, muitas vezes, não há outra escolha senão fugir, pelo que não surpreende os números avassaladores da deslocação forçada em 2022.
Testemunhamos, repetidamente, como conflitos violentos e outros fatores de deslocamento forçado têm consequências que assumem dimensões não só regionais, mas também globais
Diz-nos as Nações Unidas que mais de 100 milhões de pessoas em todo o mundo foram forçadas a abandonar as suas casas, um número que duplicou no espaço de uma década. “Vemos uma multiplicação de novos conflitos e antigos que parecem nunca morrer. Há razões muito fortes para fazermos tudo para evitar conflitos e fazer tudo para resolver conflitos”, disse António Guterres2. Mas estamos mesmo? Perante a exigência dos desafios nunca foi tão importante abordar, com determinação, as causas estruturais das migrações forçadas , nomeadamente através da prevenção precoce de situações de crise, a resolução pacífica dos conflitos e a proteção dos Direitos Humanos.
A prevenção remete-nos para a necessidade de um trabalho cada vez mais colaborativo, envolvendo um conjunto vasto de atores, incluindo os cidadãos e a sociedade civil, estratégias e iniciativas conjuntas que fortaleçam a coesão social e a promoção dos direitos humanos. Nessa medida parece-me que referências e ações no domínio da Educação para o Desenvolvimento comprometidas com a transformação social e o aprofundamento da cidadania global ajudam a compreender uma realidade que muitos não conhecem diretamente, facilitando uma leitura mais crítica das desigualdades locais e globais.
Perante a exigência dos desafios nunca foi tão importante abordar, com determinação, as causas estruturais das migrações forçadas
De facto, a complexidade das migrações forçadas sublinha a urgência de, nas palavras de Volker Turk3, colocar tanta ênfase na “compreensão” (dos fenómenos) quanto na “resposta”. Apostar na sensibilização para a importância de um mundo mais justo e sustentável, alicerçado em ações pedagógicas e na mobilização coletiva, deve ser o caminho a seguir. No Conselho Português para os Refugiados (CPR) vemos o trabalho com as escolas determinante para este fim, dando a conhecer não só os direitos dos refugiados, mas também a situação nos países de origem, informando e sensibilizando toda a comunidade escolar de forma simples e direta. Justamente, uma educação de qualidade, comprometida com a EDCG, pode ajudar a prevenir o racismo e a xenofobia, e promover uma cultura de paz e de solidariedade.
Pese embora se reconheça o papel da sociedade civil na mobilização para o acolhimento de forma solidária com quem foge, quer em 2015 com a chegada de milhares de refugiados sírios, quer no apoio aos deslocados da Ucrânia, não deixa de ser essencial apostar-se na capacitação das comunidades, facilitando processos de aprendizagem e consciencializar para a promoção de sociedades cada vez mais humanistas.
Penso que é o caminho a seguir. E, como diria o Alto Comissário Filippo Grandi, “não vamos desistir - devemos isso a 100 milhões de refugiados e pessoas deslocadas em todo o mundo”.
Notas:
1 O Comité Executivo do Alto Comissariado (ExCom) reúne-se anualmente em Genebra para aprovar os programas e o orçamento da agência, e refletir sobre o estado da proteção internacional com parceiros intergovernamentais e não governamentais. A última sessão foi a 10-14 de outubro de 2022.
2 Discurso de abertura no encontro de imprensa à margem do Fórum de Oslo, 19 de junho de 2018.
3 Alto Comissário dos Direitos Humanos da ONU desde 17 de outubro de 2022.

Este artigo foi originalmente publicado na Edição da Revista da Plataforma Portuguesa das ONGD de novembro de 2022 "Educação para o Desenvolvimento e a Cidadania Global em Tempos de Mudança". Leia ou faça download da edição completa da Revista aqui.