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27 mai 2024 Fonte: CIVICUS Temas: Sociedade Civil, Direitos Humanos, Cidadania e Participação, Advocacia Social e Política

A CIVICUS, aliança global da sociedade civil da qual a Plataforma Portuguesa das ONGD é membro, lançou a 13ª edição do seu Relatório Anual “State of Civil Society 2024”. O Relatório identifica as tendências em 2023 relativas à ação da sociedade civil, a todos os níveis e em todas as áreas, desde respostas a conflitos e lutas pela democracia, inclusão e justiça climática, até exigências de reforma da governação global.

O relatório é diretamente informado pelas vozes da sociedade civil afetadas e que respondem às principais questões e desafios da atualidade e oferece uma perspetiva da sociedade civil sobre o mundo tal como se encontra no início de 2024: um mundo atormentado por conflitos e crises, incluindo de valores e ao nível das instituições democráticas, mas no qual a sociedade civil trabalha para proteger os Direitos Humanos e a Justiça Global nestes tempos difíceis. Reflete mais de 250 entrevistas e artigos publicados pela CIVICUS sobre a situação em mais de 100 países e territórios.

Segundo a CIVICUS, uma em cada seis pessoas encontra-se exposta a um conflito e mais de 114 milhões de pessoas encontram-se deslocadas. O número de mortes provocadas por conflitos encontra-se no seu nível mais elevado em décadas, com um aumento de 62% em 2023. Cerca de 300 milhões de pessoas necessitam de assistência humanitária e proteção. No entanto, a despesa militar global atingiu um valor recorde de 2,2 biliões de USD e o espectro do genocídio regressou ao mundo.

O espaço de atuação da sociedade civil está no seu pior estado desde o lançamento da cobertura global do CIVICUS Monitor em 2018. Cerca de 118 países têm agora sérias restrições ao espaço cívico e apenas 2,1% das pessoas vivem em países em que o espaço cívico é considerado aberto.

Os ataques à democracia estão a dificultar o avanço das soluções que as crises atuais exigem. No início de 2023, 72% das pessoas viviam em regimes autoritários e a situação não melhorou com o passar do ano. Um número recorde de países está a deslizar para o autoritarismo, enquanto o número de países em processo de democratização é o mais baixo em décadas. A sociedade civil está a trabalhar para defender a democracia e responsabilizar os líderes políticos, mas está a tornar-se mais difícil à medida que o espaço cívico é restringido.

2023 foi o ano mais quente já registado. Crescem os apelos por mudanças urgentes por parte da sociedade civil, mas em 2023 os/as ativistas climáticos/as enfrentaram uma resistência crescente. Muitos estados estão a restringir o espaço para o ativismo climático, incluindo nos países do norte global, onde existem movimentos climáticos vibrantes e onde o direito de se manifestar costumava ser respeitado. De acordo com a Global Witness, cerca de 2000 defensores da terra e ambientalistas foram assassinados em retaliação pelo trabalho que realizaram entre 2012 and 2022, 34% das mortes sofridas por pessoas indígenas: um a cada dois dias. A América Latina é a região com mais incidência de mortes, representando 88% das mortes em 2022.

No seu relatório, a CIVICUS destaca os ataques à sociedade civil, como um dos desafios que requerem mais atenção atualmente. A organização evidencia que 7,15 mil milhões de pessoas em todo o mundo são, de alguma forma, restringidas nos seus direitos de cidadania (de associação, de expressão e de reunião pacífica) e de envolvimento em movimentos ou organizações da sociedade civil, num contexto de intenso recrudescimento mundial de movimentos populistas e da eleição de populistas de direita, a maioria dos quais com tendências xenófobas. Esta realidade tem sido acompanhada pela mobilização de grupos extremistas contra os direitos humanos e a justiça social, valores fundamentais e progressistas que motivam a maior parte das organizações deste setor. Um fenómeno recente é o posicionamento destes grupos na esfera da sociedade civil, mas sem uma partilha de valores ou métodos de atuação que enfatizam a importância de um diálogo que respeite as diferenças, tendo como função atacar estes mesmos valores. Da mesma forma, as Organizações da Sociedade Civil (OSC) orientadas para a defesa dos direitos humanos, ao defenderem os direitos destes grupos excluídos e rejeitarem as mensagens de ódio e divisão, viram o seu espaço de intervenção ser reduzido por restrições do foro legal, financeiro, sendo os seus ativistas criminalizados pela realização do seu trabalho ou sofrendo ataques físicos e perseguição pessoal. Entre os exemplos de países europeus que adotaram restrições, contam-se países como a Itália, a Alemanha ou a Holanda.

Não obstante a deterioração das condições de atuação das OSC, há igualmente uma resposta generalizada de resistência e de apoio aos grupos que mais necessitam, motivado por uma visão de compaixão, dignidade humana e comprometimento para com uma humanidade partilhada, num período em que, como referido no relatório da CIVICUS, se verifica o maior ataque, desde a Segunda Guerra Mundial, a respostas de cariz humanitário.

No seu relatório, a organização denuncia a existência de um défice generalizado de compaixão a nível global, o qual impõe uma nova resposta por parte da Sociedade Civil a nível internacional e nacional, de proteção do direito à ação humanitária e de defesa da compaixão como pilar fundamental em qualquer sociedade digna deste nome. Impõe-se a elaboração de uma nova narrativa sobre como a Sociedade Civil pretende concretizar mudanças societárias e que explique a intervenção das OSC e o que defendem, de forma a responder à insatisfação crescente dos cidadãos e das cidadãs e a desafiar as estruturas de poder que falharam nas respostas dadas aos problemas das pessoas. Esta narrativa deve ter como objetivo a diminuição da polarização social e a promoção de união entre as pessoas em torno da solidariedade humana. A preparação desta nova narrativa implica uma maior proximidade e conexão com os cidadãos e as cidadãs e a construção de um clima de confiança da opinião pública em relação à Sociedade Civil, a qual tem vindo a decair.

A esperança de mudança fortalece-se com a constatação dos sucessos verificados em 2018, ano que se caracterizou pelo aumento exponencial de mobilizações públicas de cidadãos e cidadãs em torno de causas comuns (como os direitos das mulheres, das pessoas LGBTI, os direitos de migrantes e refugiados, o combate à corrupção e à austeridade ou à desigualdade), mas também em que se reconhece o aparecimento de respostas inovadoras das OSC perante as dificuldades e restrições de que são alvo.

Num mundo que se modifica com um dinamismo e a um ritmo imparável, as OSC têm a oportunidade de mobilizar, de construir novos argumentos, de conduzir as pessoas de coligações negativas para positivas e de reinventar as nossas sociedades. Esta reinvenção resultará tanto melhor, quanto mais se promover a necessidade de uma maior justiça a nível económico, em que as pessoas e os seus direitos sejam colocados no centro das ações, e quanto mais se incentivar à melhoria da qualidade das democracias, para que as pessoas possam participar na tomada de decisão e os movimentos possam formar-se para a criação de alternativas de resposta aos desafios da atualidade.

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